Quinta-feira, Maio 2, 2024

A missão do CEO e a gestão das expectativas dos acionistas

Angus Maitland, Presidente da AMO Global

A caracterização da função de CEO de uma empresa cotada nunca foi fácil, mas nos loucos dias de finais do Século XX tudo era mais claro: maximizar o retorno para os detentores de participações na empresa. Sempre existiu um forte debate em torno da missão do CEO a curto, médio ou longo prazo e inclusivamente em torno dessa mesma periodicidade. E o que esperavam os acionistas? Crescimento sustentado do valor, dividendos elevados e crescentes e consequente aumento do retorno total. A única certeza era que, se o desempenho financeiro fosse mau, o mandato do CEO seria curto.

Os proprietários de empresas eram geralmente um grupo misterioso. E que se escondia por vezes por trás de empresas mandatadas, empregando muitas vezes gestores para administrarem os seus fundos, conferindo-lhes geralmente liberdade total em termos de seleção de investimento e liberdade de voto.

A falta de comunicação entre as empresas e os seus acionistas institucionais era histórica e alimentava uma ampla indústria de consultoria composta por bancos de investimento, empresas de gestão de ativos, votação por procuração e monitorização de ações. O conhecimento das políticas, opiniões e atitudes dos principais acionistas foi uma arma altamente persuasiva no arsenal das empresas de consultoria às empresas.

O impulso no sentido de maximizar o retorno para o acionista sempre teve os seus críticos; e, à medida que os problemas gerados pelo crescimento económico desenfreado se tornavam cada vez mais aparentes, a leva de críticas aumentou.

Terminado que está o tumultuoso ano de 2020, os CEOs deparam-se agora com um cenário bem diferente. A história olhará para trás, para este ano, como o ano da primeira pandemia global em mais de um século. Isso, por si só, exigiu qualidades de liderança bem diferentes, nomeadamente compaixão, e levou, perigosamente para alguns, a uma crescente participação financeira do Estado nos negócios. Colocou alguns setores contra a parede, outros houve que lucraram com isto e levou igualmente à implementação de formas radicalmente diferentes de trabalhar. Só o tempo dirá o quão duradouras serão as mudanças comportamentais provocadas por esta pandemia.

Numa feliz coincidência, na mesma semana de dezembro de 2020 em que a enorme praia australiana de Byron Bay, a preferida ao que tudo indica das celebridades de Hollywood, foi praticamente destruída por ondas gigantes de 8 metros em pleno do verão (descrito pelo presidente da Câmara de Bantry Bay como “um episódio climático extremo associado às alterações climáticas ”), 30 dos maiores gestores de ativos do mundo, representando mais de $ 9 biliões de ativos sob gestão, lançaram a “Iniciativa Zero Líquido”, comprometendo-se no sentido de trabalharem em parceria com os detentores desses ativos na prossecução de metas de descarbonização com vista a atingir emissões líquidas zero até 2050 ou mesmo antes. O CEO da Fidelity International afirmou: “reconhecemos que as alterações climáticas representam um dos riscos, se não mesmo o mais significativo para a rentabilidade e sustentabilidade das empresas a longo prazo, incluindo da nossa”. E eis que temos agora gestores de ativos dispostos a arriscar e contrariar o ‘status quo’.

Na mesma semana, a Unilever, o gigante do consumo que movimenta 115 mil milhões de libras, tornou-

-se na primeira empresa do FTSE 100 a anunciar que submeteria seus planos de redução das emissões de gases de efeito estufa a votação por parte dos seus acionistas.

O cenário de evolução dos negócios representa um enorme desafio de comunicação para os CEOs à medida que o leque de acionistas de uma empresa aumenta e se torna mais articulado e numa altura em que a “sociedade de notícias falsas e pós-verdade” abre caminho de forma significativa nas democracias liberais ocidentais com a ajuda das redes sociais. A necessidade de os CEOs administrarem bem os seus negócios e proporcionarem fortes rentabilidades para os acionistas continua a ser crucial. Mas as exigências de outros acionistas interessadas têm que ser também devidamente atendidas e geridas.

Esses acionistas, que exigem respostas sobre questões como sustentabilidade, responsabilidade das empresas e governança, pareciam constituir no passado um obstáculo à criação de valor na senda da geração de valor para o acionista. Mas já não é assim. Mas têm agora também “licença para operar” nas empresa e são cada vez mais determinantes a longo prazo para preservar o valor e não como alguém que compromete o ambiente que permite a criação desse mesmo valor.

Conhecer e compreender o leque mais amplo de acionistas é agora uma prioridade para os CEOs. Não é uma tarefa fácil numa altura em que abundam sentimentos anti negócios. Os CEOs bem-sucedidos serão aqueles que conseguirem antecipar tendências sociais e incorporar iniciativas positivas nas suas estratégias empresariais para lhes darem resposta. O sucesso será sinónimo de marca empresarial mais forte, um pré-requisito para negócios mais fortes. Para tal será necessário mais do que uma mudança positiva de atitudes. A reputação das empresas constrói-se através do bom comportamento e boa comunicação empresarial; sendo que esta última se tornou mais difícil e complexa de gerir com sucesso através das redes sociais.

O jornalismo de alta qualidade e formador de opinião nunca foi fácil de gerir, mas sempre teve um grau de integridade que permitiu um envolvimento e debate sérios. As redes sociais e a desinformação vieram alterar isto profundamente. Para bem da democracia, esperemos que o jornalismo livre e honesto sobreviva e prospere. Mas as empresas não podem ficar sentadas à espera. E têm de agarrar mais fortemente as oportunidades proporcionadas pelas redes sociais e lutar contra os grupos que tentam provocar danos através de ações de desinformação.

O crescente reconhecimento da existência de uma confluência de interesses entre empresas e grupos de acionistas é motivo de otimismo. O caminho a seguir passa por fortalecer essa confluência por meio de ações positivas e de uma boa comunicação com a chancela do CEO.

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