Nuno Galvão Teles, Managing Partner da Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados
O António, com pouco critério, fez o favor de me convidar para escrever um artigo na PRÉMIO para este número celebrativo.
Por razões que o coração desconhece, dado o mote dos “direitos humanos” que foi escolhido pelos editores, não duvidei dois segundos sobre o tema que devia abraçar.
O campo dos direitos humanos é fértil. Julgo mesmo que só nos tornámos “civilizados” quando conseguimos compreender a real dimensão do mesmo, nas suas múltiplas aceções.
Mais uma vez, a Europa foi precursora na invenção do conceito e depois na sua divulgação. Após a revolução francesa, os americanos, com a sua habilidade natural para transformarem a palavra de outros em invenções suas, protagonizaram no grande e enorme estadista Thomas Jefferson o seu mais vibrante proclamador.
É neste contexto, e voltando ao mote que nos guia, que me pareceu oportuno – sem saber bem explicar porquê – explorar um tema de discriminação milenar ao qual não tem sido dado grande importância, quando põe em causa, discrimina e afeta os humanos desde que Adão mordeu o que não devia.
Falo de algo tão simples como a altura.
Ah, pois é, meus caros, há quem sofra desde pequeno com este grande problema: nem todos nascemos com a altura que a sociedade considera adequada. Ser baixinho é um fator negativo de relacionamento e inserção que começa logo no primeiro dia de escola.
Ora, por que razão a cor da pele, as deficiências físicas, a orientação sexual e muitas outras coisas são alvo de tanta polémica e, hoje, felizmente, objeto de defesa dos direitos individuais dos atingidos, enquanto a “altura” não é vítima da mesma atenção, consideração jurídica, política, até “humanitária”?
Foi exatamente isto que me propus de forma simples, e necessariamente sintética, abordar.
Descobri logo à partida que “height discrimination (also known as heightism) is prejudice or discrimination against individuals based on height”. E “various studies have shown it to be a cause of bullying, commonly manifested as unconscious microaggressions”.
Que maravilha, algo que pensava eu só era sentido por quem sabe que lhe falta sempre um centímetro ou mais, já estava devidamente estudado, enquadrado e até “explorado”. Reparem na subtileza danosa e perversa: a própria definição do conceito acaba em “(…) microaggressions”. Isto é, apesar de ser uma forma de discriminação e, por isso potencialmente violadora de direitos básicos do ser humano, não consegue pela sua altura não ser mais que uma “unconscious microaggression”.
Baixinhos, não vos importais. Apesar da discriminação ter conceptualmente uma definição em si baixa ou “micro”, a verdade é que a ciência (e talvez até a tradição) já identificou há muito a verdadeira natureza desta infame discriminação.
“Studies have observed that infants as young as 10 months old unconsciously associate height with leadership potential, power, strength and intelligence”.
Pior:
“Both the cognitive and unconscious heuristic association between height and the mentioned traits have also been found to be stronger when assessing men than women”.
Ou seja, até pelo sexo ou género há verdadeira discriminação em desfavor dos homens; não basta ser baixo, é ainda pior ser baixo e homem.
Para os interessados, o tema foi, em termos académicos, abordado pela primeira vez por Saul Feldman, em 1971, com a tese “The presentation of shortness in everyday life –height and heightism in American society. Toward a sociology of stature”.
Mas há inúmeros estudos à disposição para confirmar como a “altura” das pessoas afeta a carreira profissional e a inserção dos “baixos” no espaço de trabalho. Discrimina até em dimensões como o salário ou o acesso a lugares de liderança. Para não falar de populares discriminações em outras dimensões tão ou mais importantes para a vida pessoal.
Pois, meus caros, sendo certamente verdade que devemos incluir no elenco dos “direitos humanos” a defesa intransigente dos desfavorecidos pela míngua de centímetros, posso sem qualquer problema – mesmo do ponto de vista académico – afirmar da altura dos meus olhos que Napoleão não foi uma exceção.
Há quem saiba – e de que maneira – fazer da altura, ou menor dimensão, a sua arma. A minha querida mãe é disso um bom exemplo – assim de repente admito que não me recordo de outros. No caso dela (e certamente pode ser exportado para amigos invulgares) tem no coração, na sabedoria, no humor e na inteligência mais centímetros que os bárbaros “altos” alguma vez imaginaram poder vir a ter.
A altura pode mesmo ser fator de discriminação, noutros casos é bem mais do que grande animação.
António, um abraço e parabéns por mais este projeto de sucesso.
P.S. – Num próximo artigo, se alguém louco me voltar a convidar, falarei de outras minorias de que sou próximo, como a dos fumadores e carecas.
P.S. 2 – Agradeço à Wikipedia as citações e a facilidade para não investigar a sério.
(Texto escrito ao abrigo do novo acordo ortográfico)