Domingo, Maio 5, 2024

A vontade de querer voltar a ser um aluno exemplar

João Vaz de Almada, CV&A Head of Office Moçambique

2020 poderá ser um ano de viragem em Moçambique, iniciando um ciclo de retoma rumo ao progresso e desenvolvimento há muito ansiado por todos. Após a grave crise económica que assolou o país desde 2014, para a qual muito contribuiu o chamado caso das “dívidas ocultas”, Moçambique tem feito tudo para reconquistar a confiança da Comunidade Internacional, desejando voltar rapidamente aos tempos – meados dos anos 90 – em que era orgulhosamente conhecido como um aluno exemplar.

Acho que esse caminho tem de ser de atitude e de comportamento, de cultura. Não basta que seja de intenção política, tem que haver uma coisa assumida no quotidiano, isto é quando olho para alguém que não é o do meu partido político – embora eu não tenha nenhum-, mas eu tenho que saber que tenho que escutar a essa pessoa com vontade de escutar e com vontade de perceber que ele pode ter razão.”

Estas foram as palavras do maior escritor moçambicano, Mia Couto, uma das vozes mais escutadas e respeitadas no país, logo após a tomada de posse do presidente Filipe Jacinto Nyusi, que iniciou, no passado dia 15 de Janeiro, o seu segundo e último mandato. Em relação ao sector do Oil & Gas, que deverá mostrar toda a sua pujança a partir de 2024, o escritor revelou-se optimista: “Há a ideia de que eles [os recursos naturais e minerais] são sempre uma maldição, e que só correu bem na Noruega. Acho que isso é uma desconsideração, uma desqualificação à partida de que os africanos não podem fazer bem, podem fazer bem”. No entanto, Mia defendeu que o país não pode ficar refém do gás, este não pode ser “a economia de Moçambique.”

Efectivamente, de alguns anos a esta parte, Moçambique tem estado a descobrir enormes quantidades de gás natural, que tornam o país numa das maiores reservas mundiais deste recurso. Estudos realizados por organizações internacionais especializadas na matéria afirmam que as reservas de gás de Moçambique fazem parte das maiores do mundo. Os projectos das companhias petrolíferas no Norte do país têm o potencial de transformar a economia moçambicana, tornando o país, a par do Qatar, no maior exportador de gás natural do mundo.

Só para se ter uma ideia, Moçambique deverá receber cerca de 95 mil milhões de dólares nos próximos 25 anos de receitas provenientes dos investimentos das multinacionais na exploração de gás natural, ou seja, sete vezes mais do que o valor do actual PIB.

A chamada Decisão Final de Investimento (DFI), assinada entre o governo e o consórcio liderado pela empresa norte-americana Anadarko para a exploração de Gás Natural Liquefeito na Bacia do Rovuma, teve lugar no passado mês de Junho e deixou o país mergulhado numa grande esperança. Aliás, imediatamente após este evento, assistiu-se a uma valorização da moeda local, o metical, prevendo-se que esta tendência se mantenha durante todo o ano de 2020.

O Fundo Monetário Internacional (FMI) prevê que Moçambique tenha uma forte recuperação económica neste ano de 2020 e uma inflação baixa. Os números do FMI apontam para um crescimento do PIB de 5,5% em 2020. Já no final de 2019 o relatório “World Economic Outlook” previa uma aceleração para 6% em 2020 chegando aos 11,5% em 2024, quando as primeiras receitas do gás se fizerem sentir. É um crescimento a dois dígitos, enorme, só comparável ao ocorrido nos primeiros anos da paz em meados da década de 90.

A forma como Moçambique reagiu à devastação provocada pelos ciclones Idai e Kenneth, no primeiro semestre do ano passado, tem merecido rasgados panegíricos da Comunidade Internacional e tem sido motivo de aproximação entre as partes, após o corte abrupto do apoio dos doadores ao Orçamento de Estado em 2016, na sequência do caso das chamadas dívidas ocultas. Prova disso foi a recente deslocação a Maputo do Director-Geral Adjunto desta instituição financeira, Tao Zhang, deixando claro que “o FMI está pronto para reforçar ainda mais a sua colaboração com 

  as autoridades moçambicanas e ajudar a avançar com a sua agenda de reformas.” Aproveitando este bom ambiente, no final de Fevereiro, o governo moçambicano, através o ministro da Economia e Finanças, Adriano Maleiane, submeteu a esta instituição de Bretton Wood uma carta a solicitar o envio ao país de uma equipa técnica para retoma do apoio ao Orçamento do Estado (OE). “Temos de trabalhar todos para mobilizar recursos, é um orçamento que tem de responder a um contexto em que a receita também precisa de ser melhorada”, referiu aquele governante à imprensa. De acordo com Maleiane, o pedido “significa que as negociações em curso entre o governo moçambicano e o FMI estão num bom caminho, tal como os responsáveis do fundo também já tinham deixado transparecer numa visita recente a Maputo.”

Mas, tal como uma medalha, também Moçambique ostenta um reverso e bastante duro. O conflito na província Cabo Delgado, no extremo norte, já vai no terceiro ano e não dá mostras de abrandar, continuando desconhecidas as intenções de quem ataca. Esta instabilidade está a levar a alguma retracção do investimento, uma vez que os ataques ocorrem precisamente na zona onde estão instaladas as companhias que detêm os contratos de exploração. E o pior é que não há um fim à vista.

De mais fácil resolução, embora se venha a arrastar há demasiado tempo, são os ataques no centro do país, na zona da serra da Gorongosa, atribuídos a uma facção dissidente da Renamo – antigo movimento rebelde, hoje o principal partido da oposição – que não reconhece a liderança de Ossufo Mamade, o sucessor do carismático Afonso Dhlakama, falecido em Maio de 2018, vítima de doença.

No seu discurso de investidura, em Janeiro último, o presidente Filipe Nyusi, afirmou que a prioridade absoluta do seu novo mandato é a preservação da paz, condição indispensável para o desenvolvimento. “Continuaremos, nem que isso nos custe a vida, a defender e promover a paz”, disse. Se estas palavras encontrarem eco no terreno, estará assegurado meio caminho andado rumo ao sucesso e à prosperidade.

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