Pode causar estranheza o título, sobretudo para quem se tenha habituado a ver na democracia, não apenas o pior dos regimes excetuando todos os outros (nas celebradas palavras de Winston Churchill), mas também uma necessária garantia do respeito pelos direitos humanos, sejam (com liberdade e simplismo conceitual) os fundamentais sejam os que se situam nas esferas circundantes à destes. Mas nem sempre é, embora seja ela própria resultado do exercício de um direito que se tem reconhecido, de há uns tempos a esta parte e nalguns lugares, como fundamental (aliás, nesta formulação temporal e espacial logo se pode começar a ver algum do “relativismo” associado a estas matérias, ‘et pour cause’). E nem sempre é, por uma razão tão óbvia quanto por vezes esquecida, que resulta do facto de a soma dos votos poder ir no sentido da tomada de decisões que colocam em causa direitos humanos, basta que uma maioria simples ou qualificada (consoante as regras consagradas em cada regime) o dite. Por isso se diz – e deve sublinhar bem – que existem democracias liberais e iliberais, no sentido de que as primeiras respeitam as liberdades individuais e as segundas não, total ou parcialmente. Mas não se julgue que o termo democracia iliberal cai bem apenas àqueles regimes onde se vota mas depois existe limitação de certas liberdades civis, como de expressão, associação, etc., havendo também pouco escrutínio ou controlo da atividade governativa. O termo cai igualmente bem, e tanto mais quanto mais os mecanismos de limitação sejam menos evidentes ou mais sub-reptícios, aos casos de democracias “mais abertas” mas onde as maiorias votam no sentido de limitar, condicionar ou “normativizar” minorais (melhor dizendo, indivíduos que, nalgum aspeto fundamental da sua vida, não afinam pelo diapasão eleito pela maioria). Donde, se impõem duas conclusões, mas também um enorme problema que emerge da segunda delas. Primeira conclusão: uma democracia é tanto mais liberal (no sentido de respeitar as liberdades individuais, mesmo contra o sentido de voto ou de pensar da maioria), quanto mais cultive um sistema de ‘checks and balances’, e, também, quanto mais viva o debate, o escrutínio, a pedagogia, a reflexão, a separação entre a esfera da moral e a esfera da lei, a diversidade, o pluralismo e, sobretudo, a valorização da pessoa e da sua dignidade como pontos de Arquimedes do sistema. Segunda conclusão, e um enorme problema: os direitos humanos, especialmente os fundamentais, devem ser barreiras ao exercício democrático, devem ser (para usar a expressão feliz de um constitucionalista) trunfos contra a maioria. Mas – e essa é pergunta de um milhão em qualquer moeda, e para a qual este texto já não tem caracteres disponíveis, e eu tenho apenas um punhado de dúvidas e alguns apoios provisórios – resta sempre a questão de saber que direitos fundamentais são esses, onde estão inscritos, quem os dita ou revela, quais as suas fontes? Um oceano de dúvidas, problemas, desafios, navegando de costa a costa, de um lado um extremo jusnaturalismo, do outro um extremo positivismo – Tucídides diria, talvez, a ordem cósmica e a vontade dos homens – , sem saber bem onde fundear uma embarcação que leve de lastro tanto de democracia quanto de direitos humanos, ou a divina proporção de cada um.
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