Miguel Barros, Presidente da Associação Portuguesa das Agências de Publicidade, Comunicação e Marketing (APAP)
A publicidade irá refletir e responder às novas preocupações e necessidades dos consumidores, que deverão sofrer alterações, algumas de contexto, outras estruturais.
O que se segue, após este período de luta contra a pandemia, é uma crise económica, que se diz sem precedentes, mas com uma dimensão que nos permite olhar para as alterações de comportamento perante a, também grande, recente crise sanitária que se impôs.
Numa primeira fase, o consumidor tornar-se-á mais oportunista, à procura de bons negócios e, por isso, será menos fiel às marcas. Vai defender o seu cabaz alimentar e gastos em saúde acima de todas as outras categorias, mas mesmo nessas áreas fará algum ‘trading down’. Teremos então ofertas e respetiva comunicação adaptadas a esta realidade, esperando-se bastante divulgação de negócios cruzados, promoções e descontos, programas de fidelização e todos os díspares formatos focados no preço. São as alterações contextuais de um período de crise em que a gestão do orçamento familiar será muito rigorosa.
Por outro lado, este período também traz mudanças estruturais que resultam das particularidades do momento e que sugerem alterações comportamentais de fundo, com reflexo nas marcas e produtos e, consequentemente, na sua comunicação.
Momentos semelhantes aos que vivemos, noutras geografias, mostram que as marcas que souberam estar perto dos consumidores durante o período mais difícil tiveram grandes oportunidade de crescimento. Mas novas marcas irão também surgir.
A casa e a família irão destacar-se. São ambientes de proteção e ajuda que passarão a ser mais valorizados e aos quais, por consequência, a publicidade dará mais atenção. O lar ganha mais importância do que nunca, quer enquanto espaço quer na forma como o experienciamos. O prazer de decorar, cozinhar, praticar exercício ‘indoor’ e entreter vai sofrer alterações e ser mais reconhecido. O mesmo acontecerá com o consumo de cultura, informação e lazer ‘indor’. O comércio local sairá fortalecido.
Os espaços públicos e o seu usufruto, todas as atividades de tipo “do it yourself”, e os mercados secundários de produtos ou ‘trading’ de oportunidade voltarão a ganhar relevância.
A necessidade de interação com tecnologias levou a uma aprendizagem forçada para todos, mas principalmente para os mais velhos. Percebemos que estamos mais preparados do que pensávamos para tratar do quotidiano a partir de casa, e que isso facilita muito a nossa vida. Que podemos encontrar mais vezes a família e os amigos do que estávamos habituados e até trabalhar com uma eficiência inesperada sem precisar de ir ao escritório. Estas são mudanças na forma de viver que serão, certamente, incorporadas no dia a dia das pessoas, das marcas e da comunicação.
Este período funcionou também como um acelerador para os meios digitais, que vão ganhar muito peso no consumo de media, entretenimento, plataformas de pagamento, espaços de compra, ferramentas de socialização… Entre todas as idades e géneros.
A publicidade será mais do que nunca uma realidade digital, mais complexa porque estará diretamente ligada à concretização imediata e aos resultados. A saúde, o desporto e a alimentação, assim como novos hábitos de higiene ganharão também importância. Em todas as indústrias e produtos.
A boa publicidade, como sempre, será a que sabe olhar para este novo consumidor e reconhecê-lo mais informado, ainda mais atento (mais formado é estranho), mais adulto.