Segunda-feira, Maio 6, 2024

“Fazendo enganamo-nos algumas vezes; não fazendo, enganamo-nos sempre – Alain Romain”

Manuel de Lemos, Presidente da União das Misericórdias Portuguesas

Escrever sobre esta pandemia e o papel que as Misericórdias e todo o setor social está a desempenhar, é escrever sobre algo que a tradição dos europeus e dos portugueses reconhece, mas que julgava ter sido arrumada num qualquer escaninho mais profundo da memória para eventual utilização de historiadores e outros investigadores.

De facto, a “peste”, as “pestes”, condicionaram a evolução das sociedades, da religião, das artes, das guerras, das políticas europeias e portuguesas desde a Peste de Justiniano à Pneumónica e até mais recentemente à gripe asiática, à poliomielite e à SIDA.

Mas a sociedade de consumo deste primeiro quartel do século XXI ajustada a questão da SIDA, de alguma forma considerou que esta questão estava arrumada ( o Ebola, o Zika, o Dengue, a gripe das aves, eram apenas episódios para países subdesenvolvidos e pobres da África, América Latina e de algumas regiões da Ásia longínqua) e logo como sempre acontece, baixou a guarda.

Logo quando este vírus aliás de uma estirpe conhecida pela comunidade científica, os coronavírus, apareceu, ninguém estava preparado a nível mundial desde logo pela sua rapidíssima propagação (que a globalização favorece) e pela sua agressividade que o torna particularmente letal em pessoas com fragilidades. Desde logo, os mais idosos, mas também pessoas mais jovens com várias doenças crónicas e subnutridos, a viver em condições onde falta de todo a higiene, a água potável e outras condições mínimas como na Índia e no Brasil.

Portugal, neste contexto também não estava de todo preparado para enfrentar a pandemia.

E por isso apesar de todo o alarido, a primeira prioridade foi (e será) evitar a rutura do SNS, o que pela mão da Ministra Marta Temido, com a cumplicidade ativa do Presidente da República e do Primeiro Ministro tem sido conseguido, apesar de tudo, num mar de dificuldades, que de um momento para o outro se podem complicar.

Essa preocupação que, a meu ver, é legítima, conduziu inevitavelmente a que, pelos motivos acima aduzidos, os idosos e as Instituições (sobretudo do setor solidário onde as Misericórdias se integram) que deles cuidam e acolhem, se transformassem no “bombo da festa” dos interesses, de políticos pouco ou nada esclarecidos ou com uma agenda demasiadamente evidente e de certa comunicação social sedenta de sangue, de tragédia e de horror ( as imagens dos lares italianos onde os trabalhadores desertaram e as equipas de salvamento encontraram lado a lado pessoas mortas e outras agonizantes, mas vivas, não mais saíram das nossas cabeças).

As Misericórdias de Portugal depois do choque inicial, cientes da sua identidade, dos seus valores, da sua natureza e da sua História reagruparam-se à volta da sua União e iniciaram um processo notável de proteção aos mais frágeis que têm a cargo; não na base do “coitadinho” e da menorização, mas do respeito, da cidadania e da dignidade sobretudo dos mais velhos que tanto nos deram e continuam a dar.

O Estado muito cedo percebeu este caminho e por isso o Presidente da República, o Primeiro Ministro, e vários membros do Governo entre eles a Ministra Ana Godinho ( que tem sido incansável de dedicação, apoio e energia positiva) alinharam connosco e com o restante setor solidário, para reduzir o prejuízo, até que chegue a desejada vacina e ou os medicamentos que reduzam os efeitos da doença

No momento em que escrevo estas linhas despretensiosas encerra-se um ciclo de 5 semanas em que não registamos qualquer óbito nas nossas mais de 700 unidades, embora neste período, o número de infeções se tenha agudizado de novo.

Todos concordarão que é um resultado notável que honra todos os portugueses (mesmo aos críticos da crítica crítica!) no contexto europeu e mundial. Mas evite-se todo o tipo de triunfalismo a este respeito, porque infelizmente mais dia menos dia, vão acontecer óbitos. Este resultado, deve apenas servir para demonstrar que é possível, se não baixarmos a guarda, mantivermos a responsabilidade, cuidado e o rigor.

Por isso, também é legítimo exigirmos dos poderes públicos, nacionais e comunitários recursos para equiparmos as equipas e os utentes, requalificação de equipamentos e custeio do funcionamento.

Na verdade, se o fundo social europeu paga há vários anos despesas correntes do Ministério da Educação, porque não pagar também despesas correntes do MTSSS e do MS, que se destinam a salvar vidas e a reforçar a coesão social, o emprego sustentável, o desenvolvimento local sobretudo em territórios de baixa densidade, o consumo e a retoma económica?

Temos ouvido dizer que depois deste vírus nada ficará como antes. Acredito que sim, se quisermos mesmo. E para materializar o querer, vai ser necessário fazer acontecer. Neste quadro, penso ser absolutamente necessário que os quadros comunitários (incluindo a bazuca) tenham previsto um ‘voucher’ financeiro exclusivo para a Economia Social e para o setor solidário, que defina objetivos claros, regras precisas e controle a sério, mas gerido por uma comissão prestigiada indicada pelo setor ( p.e. Silva Peneda, Vieira da Silva, Mota Soares, Correia de Campos será qualquer deles um excelente presidente de uma Comissão desse tipo) capaz de negociar regulamentos em Bruxelas, de acrescentar outros fundos comunitários, e sobretudo executar esses fundos.

Término citando Alain Romain: “Fazendo enganamo-nos algumas vezes; não fazendo, enganamo-nos sempre”.

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