Sexta-feira, Abril 19, 2024

Os desafios que esperam Marcelo em Belém

Reeleito para um segundo mandato na Presidência da República com 60,70% dos votos, Marcelo Rebelo de Sousa tem pela frente algumas tarefas delicadas. Da pandemia, que o próprio elegeu como “o mais urgente do urgente”, passando pela Lei da Eutanásia, pela Bazuca europeia, até à própria governabilidade que será certamente mais difícil de garantir do que foi no primeiro mandato.

Sofia Rainho

Marcelo Rebelo de Sousa foi reeleito para um segundo mandato na Presidência da República a 24 de janeiro e viu o seu resultado reforçado em 9% face ao resultado que obtivera nas eleições presidenciais de janeiro de 2016. Uma reeleição apenas superada por Mário Soares, que em 1991 voltou a ser eleito Presidente da República com 70,3%. Mas Marcelo alcançou outro feito inédito: foi o primeiro presidente a ser o mais votado em todos os concelhos do país.

Na hora da vitória, Marcelo deixou claro, porém, que não considera este segundo mandato “um cheque em branco” e elegeu o combate à pandemia como prioridade absoluta. “É a minha, a vossa, a nossa primeira missão: primeiro, conter e aliviar a pandemia, para depois podermos passar para o que tanto precisamos”, “a reconstrução”, disse no seu discurso de vitória na noite eleitoral. Com um discurso mobilizador, Marcelo procurou também algum reposicionamento político, sugerindo que fará um segundo mandato mais interventivo, sobretudo na gestão da pandemia.

“Os portugueses querem mais e melhor em proximidade, em convergência, em estabilidade, em construção de pontes, em exigência, em justiça social e em gestão da pandemia”, afirmou, para assegurar: “Entendi esse sinal e saberei dele tirar as devidas ilações.”

Com 60,70% dos votos, Marcelo Rebelo de Sousa foi reeleito Presidente da República. Seguido de Ana Gomes com 12, 97%, André Ventura com 11,9%, João Ferreira do PCP com 4,3%, Maria Matias do BE com 3,9%, Tiago Mayan da Iniciativa Liberal com 3,2% e Vitorino Silva com 2,9%.

Ana Gomes, a única candidata da área socialista, falhou o objetivo de garantir uma segunda volta e na hora da derrota apontou o dedo ao PS, que acusou de falta de comparência nestas presidenciais. “Lamento profundamente a não comparência do meu partido às eleições”, disse, referindo-se ao Partido Socialista.

Mas o grande derrotado das eleições Presidenciais foi André Ventura, líder do Chega. Ventura falhou o objetivo imposto a si próprio de ficar em segundo lugar, à frente da candidata Ana Gomes. E logo na noite eleitoral assumiu o falhanço e anunciou que iria colocar o seu lugar à disposição e convocar novas eleições para a liderança do Chega.

A candidata do BE e o candidato do PCP também ficaram bastante abaixo das fasquias que tinham estabelecido.

Quando os afetos tomaram conta de Belém

Em 2015, foi em Celorico de Basto que Marcelo Rebelo de Sousa apresentou a sua candidatura a Presidente da República como o candidato social-democrata, de centro-direita e de formação social-cristã. Cinco anos depois, em plena pandemia, o anúncio da recandidatura surgiu o mais tarde possível e numa pastelaria perto do Palácio de Belém. Na campanha, fez questão de debater com todos os candidatos, mas abdicou do tempo de antena a que tinha direito e não apresentou um site ou um manifesto, com o argumento de que os portugueses já conhecem bem o seu percurso.

No discurso em que anunciou a sua recandidatura Marcelo invocou “o dever de consciência”, garantindo que não vira as costas nos momentos mais difíceis, numa alusão à pandemia e à crise económica por ela provocada, e apresentou-se como um fator de estabilidade política.

Os afetos e a relação de proximidade que estabeleceu com os portugueses foram a principal marca deixada por Marcelo Rebelo de Sousa no seu primeiro mandato em Belém. E se houve momento particularmente emblemático desse estilo e modo de exercer o magistrado da Presidência da República foi aquando dos Incêndios em Pedrógão Grande, em junho de 2017, e dos incêndios que ocorreram meses mais tarde em outubro. Marcelo foi de imediato para o terreno, abraçar e consolar quem tudo perdeu. E após os incêndios de outubro a ele se deveu a exigência da demissão da ministra da Administração Interna, Constança Urbano de Sousa.

Com o célebre caso de Tancos, Marcelo Rebelo de Sousa teve uma das maiores provas do primeiro mandato. O Presidente da República exigiu o apuramento das responsabilidades até ao fim, quer no roubo das armas, quer na farsa do achamento do material militar desaparecido.

Mas nem tudo foram espinhos. Marcelo recebeu no Palácio de Belém a equipa portuguesa de futebol vencedora do Euro 2016. Assim como recebeu Salvador Sobral e Luísa Sobral vencedores do festival da Eurovisão em 2017.

A coabitação quase exemplar entre Belém e S. Bento nos últimos cinco anos é também um dos principais marcos que fica do mandato de Marcelo e que culminou com a declaração de apoio à sua recandidatura pelo primeiro-ministro, António Costa à margem duma visita à Autoeuropa.

Os  desafios do segundo mandato

Logo na noite eleitoral, Marcelo colocou na lista dos ‘to do’ para os próximos 5 anos, um novo tema: a revisão das leis eleitorais, quando prometeu “tudo fazer para influenciar” os legisladores a prever o voto postal ou por correspondência, cuja inexistência em eleições presidenciais prejudica sobretudo quem vive no estrangeiro.

Mas não são poucos os desafios que o esperam no novo mandato que se inicia a 9 de março.

O combate à pandemia foi, desde logo, assumido por Marcelo como a sua principal missão em Belém nos próximos anos. “Tudo começa no combate à pandemia”, afirmou no discurso da vitória eleitoral, considerando que essa foi a principal reposta dada pelas eleições de 24 de janeiro. “Se a pandemia durar mais e for mais profunda, tudo o resto que queremos tanto, correrá pior, durará mais, será mais difícil de enfrentar. Por isso mesmo, sendo tudo urgente numa sociedade em crise, como numa Europa e boa parte do mundo em crise, o mais urgente do urgente chama-se agora combate à pandemia”, reforçou.

A primeira grande prova, e mais imediata, prende-se, no entanto, com a Eutanásia. A lei que despenaliza e regulamenta a morte assistida foi aprovada na generalidade em fevereiro de 2020, mas só recentemente chegou a Belém. Marcelo Rebelo de Sousa dispunha de oito dias para decidir se enviava o diploma para fiscalização do Tribunal Constitucional ou de 20 dias para o promulgar ou vetar. O Presidente da República decidiu enviar a Lei da Eutanásia para o Tribunal Constitucional.

O combate às desigualdades é outro objetivo apontado por Marcelo para os próximos anos. O Chefe de Estado já elegera, na sua mensagem de Natal em 2019 a redução das desigualdades como “o objetivo estratégico da década” e agora repetiu o apelo em contexto de pandemia: “Não basta dizer que não pode ninguém ficar para trás, é preciso diminuir as desigualdades que se agravaram entretanto. É preciso que aqueles que estão para trás se aproximem daqueles que estão em posição privilegiada”. E agora foi mais longe e traçou os 50 anos do 25 de Abril – que serão assinalados em 2024 – como uma meta simbólica para um país mais desenvolvido e justo.

Com um governo de minoria, e depois dos desentendimentos de António Costa com a esquerda a imprevisibilidade espreita. Assegurar a governabilidade e manter-se como o garante da estabilidade e evitar crises políticas, vai ser um dos maiores desafios para os próximos anos de Marcelo no Palácio de Belém.

A gestão da bazuca financeira que Portugal vai receber da União Europeia, à semelhança dos outros Estados-membros, para fazer face às consequências da pandemia de covid-19 e a execução dos fundos europeus é outro dos dossiês prioritários de Marcelo logo no arranque deste segundo mandato. E a este propósito, o chefe de Estado já aconselhou, aliás, “os pés bem assentes na terra” e deixou o aviso de que “a pandemia vai custar toda, e provavelmente não se sabe se não custa mais, tanto quanto o valor da bazuca, tirando o quadro plurianual”.

O Presidente, que em tempos liderou o PSD e se distinguiu no comentário televisivo, numa vida dividida entre o ensino de Direito, a política e a comunicação social, tem pois agora pela frente cinco anos que prometem ser bastante mais desafiantes do que os primeiros cinco vividos em Belém.

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