Quinta-feira, Março 28, 2024

Os dados são o novo petróleo, porém diferente

Rui Patrício
Rui Patrícioadvogado e sócio da Morais Leitão Galvão Teles, Soares da Silva & Associados

Ouve-se e lê-se cada vez mais a frase que constitui a primeira parte do título deste texto, e num duplo sentido. Por um lado, os dados são – sobretudo num mundo, numa economia e num modo de vida onde a informação, o consumo, a tecnologia, a inteligência artificial, et cetera, assumem um papel preponderante – uma matéria prima essencial, à semelhança do que o combustível fóssil foi e ainda é no nosso tempo industrial. E, por outro lado, se assim é, se a quantidade e a qualidade dos dados que formos capazes de recolher, analisar, tratar, armazenar, produzir e utilizar é (e será) assim tão importante, então trata-se de uma matéria prima valiosa, e esse é o segundo sentido da analogia com o petróleo. É indiscutivelmente verdade, e num tempo onde tudo muda, e rapidamente, a mudança e a sua gestão (incluindo a geoestratégica) também passam muito por aqui. Embora, na verdade, estejamos ainda bem longe de dispensar o petróleo, pelo que talvez melhor fora dizer que os dados são, não o novo, mas um outro petróleo.

Ora, sendo tão importantes e valiosos, e como aconteceu com o petróleo (porventura, tarde), temos que prestar muita atenção à sua recolha, produção e utilização, e aos impactos que tudo isso tem e pode ter, ou seja, temos – como todos sabemos, mas nem todos praticamos, coletiva e/ou individualmente – de apostar fortemente na atenção, na regulação e na fiscalização. Nesta linha de raciocínio, mantém-se válida a analogia com o petróleo, na medida em que o perigo vai de par com a importância e com o valor, e a chave não está em meter a cabeça na areia ou em querer negar a evidência, e a evidência é a importância crescente dos dados no nosso presente e no nosso futuro. A chave não é o se, é o como.

Mas as necessidades de atenção e de regulação fortes acentuam-se muito se pensarmos que se trata de matéria prima que tem pelo menos duas grandes diferenças relativamente ao petróleo, as quais redobram os perigos e a necessidade de cuidado. Por um lado, os dados não se esgotam ao ser utilizados, não são finitos, são passíveis de uma, duas, muitas utilizações. Cada barril de petróleo usa-se e desaparece, esgota-se, mas cada “barril” de dados dá para quantas vezes quisermos. E dá para o que quisermos, isto é, são múltiplas, ao sabor da imaginação /ou da necessidade, as suas possíveis utilizações. O que nos leva à segunda diferença, que se prende com os desafios éticos que os dados levantam (bem maiores do que os suscitados pelo petróleo), pois os mesmos radicam e atingem questões essenciais do nosso modo de vida, da nossa – em sentido verdadeiro e próprio – humanidade. E isso faz uma enorme diferença. E um grande, e justificado, receio. Se a pegada ecológica também é ética, a pegada que é ética em primeira linha é um desafio novo, quase radical, em relação ao qual devemos começar por perguntar se estamos conscientes e preparados. Estaremos? Ou vamos navegando à bolina, ao sabor dos ventos de ocasião e encandeados pela força da realidade e apenas reagindo, sem agir por antecipação e sem usar, reciclando com inteligência, as lições da História? Talvez nunca o desafio tenha sido tão grande e tenha exigido tanta capacidade de previsão e de planeamento. O mesmo é dizer, de ver bem longe e bem antes.

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