David Dinis, Director Adjunto do Expresso
António Costa tentou convencer Catarina Martins e, sobretudo, Jerónimo de Sousa, mas não teve sucesso. O bloco votou contra, o PCP também – e as cinco abstenções anunciadas pelo PAN e duas deputadas independentes não chegaram para levar o documento sequer à discussão na especialidade. Agora, depois de Marcelo ter ouvido os partidos e o conselho de Estado, eis o que se segue.
Diretas no PSD
Quando chegar marcado para a eleição do novo líder, 4 de dezembro, todo o ambiente no PSD será de pré-campanha para as eleições antecipadas – e a escolha dos militantes acabará influenciada por isso. Sabe-se o ponto de partida: Paulo Rangel tem a maioria das estruturas distritais e tenta capitalizar o “élan” de quem apareceu de novo; Rui Rio procura o “voto livre” apresentando-se com perfil de chefe de Governo Os sociais-democratas, pelo meio, tiveram de discutir se aceleravam prazos, desde logo do congresso que estava marcado para janeiro. Mas também terão de acelerar escolhas, nomeadamente se se juntam ou não ao CDS (mais certo), IL (menos) e o que fazem com o Chega — Rio não o excluirá, Rangel disse que sim. O objetivo, em qualquer caso, será o mesmo: tentar capitalizar o efeito Moedas, de mobilização do eleitorado de direita, e procurar atingir uma maioria na Assembleia da República. Em todo o caso, contará a capacidade de unir o partido. Assim como para a vitória (e para os ¬apoios) contará quem tenha maior expectativa de fazer um bom resultado nas eleições.
Eleições Antecipadas
Sendo, nestas circunstâncias, muito improvável uma maioria absoluta, o país entraria num de quatro cenários:
1) Vitória do PS, fazendo maioria com o PAN. É o cenário ideal de Costa – e Santos Silva admitiu-o logo a seguir ao chumbo. Não é facilmente atingível: implicaria ganhar muitos votos à esquerda, sem perder para a direita (o que vai depende muito, claro, da dinâmica do candidato vencedor nesse partido). Mas garantiria estabilidade, eventualmente até com uma coligação de Governo.
2) Vitória do PS com maioria à esquerda. Seria uma repetição do cenário atual, com mais ou menos representantes entre os três partidos, e era provável que o PS tentasse um acordo escrito, com ou sem coligação de Governo, com um ou mais parceiros. Dado o chumbo do Orçamento, o cenário de partida não é tranquilizador para o PS: Bloco e PCP colocariam a fasquia alta e cedências de Costa em matérias que antes rejeitou seriam difíceis. Em qualquer cenário, o programa de Governo passaria na votação.
2) Vitória do PSD, maioria de direita. Será possível caso o chumbo do OE levasse a uma desmobilização grande do eleitorado de esquerda. Mas, sem maioria e com um CDS menos forte, o líder do PSD teria de passar um teste: no caso da estratégia de Rio, negociar com o Chega, como fez nos Açores (atenção, o Governo regional está já sob ameaça), vendo até onde ceder nas bandeiras radicais erguidas por Ventura; no caso da estratégia de Rangel, esperar que Ventura cedesse à sua estratégia — nada lhe entregar, deixando na sua mão a decisão de chumbar ou validar um Governo de direita onde não participará.
3) PSD vence, mas com maio¬ria de esquerda. Seria a repetição do cenário de Passos em 2015. Costa teria já seis anos de governação sobre os ombros, pelo que a negociação seria mais dura; mas, por outro lado, teria a garantia de uma “obrigação” da esquerda em se sentar para negociar um terceiro Governo PS. Em coligação? Com acordo escrito? Em caso positivo, o novo Governo salta diretamente para outubro de 2022 no calendário. Em caso negativo, passa para o mês seguinte: abril.
OE-2022, Take 2
As negociações à esquerda, em qualquer caso, teriam um primeiro teste sério: fazer passar o Orçamento para 2022, chumbado meses antes. Com um acordo de Governo sólido, seria uma primeira etapa de uma legislatura que terá de provar até 2026. Mas num Governo de esquerda sem acordo escrito, seria mais um Dia D para Costa: um novo OE chumbado deixaria Portugal num pântano político, sem solução à vista. Nesse pior cenário, o PS e o Presidente teriam papéis centrais. Os socialistas pode¬riam tentar escolher um novo líder — Pedro Nuno Santos seria o melhor colocado — para tentar o que Costa falhou; já Marcelo teria na mão a decisão mais difícil do seu mandato: dar espaço ao novo líder do PS para um acordo à esquerda ou convocar novas eleições?
Todo este cenário teria reverso da medalha, caso seja a direita a governar: consegui¬riam Rangel ou Rio fazer passar um primeiro Orçamento? E se ele dependesse de Ventura? Negociariam com ele? Com que linhas vermelhas? E que garantias haveria de conseguirem novo OE para o ano seguinte? Uma pergunta para a última etapa deste labirinto político.
OE-2023, Take 1
Se Costa chegar aqui, conseguindo evitar uma crise política em 2021, não é nada certo que consiga repetir a proeza no ano que se segue, pois os riscos de chumbo do último OE da legislatura é já assumido por quase todos os socialistas. Mas se Costa não a tiver evitado e for reeleito, tudo depende das circunstâncias do momento. A economia terá melhorado? A crise dos combustíveis passou? A direita recuperou? O Governo foi remodelado, ganhou força? E a esquerda espera pelo calendário ou termina o distanciamento que ficou tão visível nesta crise?
Se o Governo for à direita, repetem-se muitas das mesmas interrogações: Rangel ou Rio conseguiriam estabilidade? Ou a direita entrava também num pântano?