Pedro de Faria e Castro, Subsecretário Regional da Presidência
Em 2021 assinalamos o 45º aniversário da autonomia político-administrativa dos arquipélagos dos Açores e da Madeira.
O contexto político nacional que se vivia em 1976 permitiu finalmente a concretização de uma velha aspiração das ilhas atlânticas, não só justa como essencial para o seu desenvolvimento económico e social. A criação de órgãos de governo próprio, legitimados pela vontade dos povos insulares, não foi uma conquista fácil. Os deputados constituintes que representaram os quatro distritos autónomos – três açorianos e um madeirense – viram-se confrontados com uma forte reacção centralista de vários sectores políticos continentais, porventura os que mais se arrogavam à defesa dos valores democráticos.
Quarenta e cinco anos depois, a autonomia político administrativa dos Açores e da Madeira continua a ser, e será, uma realidade, consolidada pela vontade e persistência das suas gentes.
A Região Autónoma dos Açores está a iniciar uma nova fase no seu processo autonómico. A terceira. Os primeiros dez anos, que corresponderam à criação da estrutura política da região autónoma, foram um período de enormes dificuldades financeiras. As exigências eram muitas, numa região onde, até então, o desenvolvimento passava ao lado, e só visitado quando as circunstâncias do interesse estratégico português ditavam a sua utilização de forma muito pontual e sem atender às reais necessidades dos Açorianos. Assim, entre 1976 e 1986, foram construídas as grandes infraestruturas de transportes marítimos e aéreos, modernizou-se uma rede viária muito frágil, dotaram-se várias ilhas de equipamentos de saúde até então inexistentes e redimensionou-se a rede de ensino. Mesmo com o forte abalo sísmico, em 1980, que afectou de forma dramática as ilhas Terceira, São Jorge e Graciosa, a autonomia político-administrativa seguiu o seu rumo.
A segunda fase corresponde à integração europeia. Com a adesão de Portugal em 1986, os Açores também passaram a ser parte das então Comunidades Europeias. E as condições do processo de desenvolvimento económico e social melhoraram significativamente. A política regional europeia, vocacionada para alavancar o PIB ´per capita´ das regiões com níveis daquele indicador significativamente inferiores à média comunitária, trouxe uma nova aceleração ao desenvolvimento dos Açores. Paralelamente, depois de um notável trabalho político das lideranças regionais junto dos respectivos Estados e das instituições comunitárias, as regiões insulares mais afastadas do continente europeu viram reconhecido o estatuto da ultraperiferia. E os Açores lá estavam. Com a Madeira.
A ultraperiferia é um conceito que resulta da necessidade de regiões com características específicas, que se revelam como desvantagens permanentes face à sua integração no mercado único europeu, poderem superar essas desvantagens através de políticas da União Europeia. Essas políticas podem-se traduzir pela adopção de programas específicos – o caso dos programas POSEI – ou pela adaptação do acervo legislativo da União Europeia às circunstâncias especiais das regiões ultraperiféricas. Em 1996, era esse o caminho que preparávamos.
Durante vinte e cinco anos, os Açores viveram uma aparente tranquilidade, à sombra do esforço produzido no período inicial – com as infraestruturas básicas concluídas -, e do reforço significativo dos apoios financeiros da União Europeia, resultado da vontade da União em promover o desenvolvimento harmónico de todas as suas regiões. Mas a falta da adopção de políticas estruturais na Região resultou no deficiente aproveitamento dos recursos disponibilizados pela Europa, mantendo os Açores nos níveis mais baixos do ‘ranking’ de desenvolvimento das regiões europeias. Foi, portanto, um período de sobrevivência autonómica, sem que se possa ter vislumbrado verdadeiros ganhos políticos, em nome do desenvolvimento económico e social dos Açores.
Temos agora a grande oportunidade para iniciar uma nova fase na vida dos açorianos, com uma nova liderança política, portadora de novas ideias e de um novo ímpeto governativo, e com a particular marca de resultar, pela primeira vez, de um programa político pluripartidário. José Manuel Bolieiro, o Presidente do Governo dos Açores, tem a missão de voltar a unir os açorianos, nas suas nove ilhas, e de construir novas vias de diálogo político, quer com os órgãos de soberania de Portugal, quer com as instituições da União Europeia, num processo fundado no princípio da subsidiariedade, reconhecido e afirmado pela Constituição portuguesa e pelos Tratados europeus.
Os Açores são uma região ultraperiférica da União Europeia. Mas, para a Europa, também representamos uma centralidade. A centralidade atlântica, tão cara à dimensão geopolítica, que afirma a Europa no Mundo. Marcamos o limite ocidental do Velho Continente e esse limite é o elo essencial de ligação com as Américas e a África Atlântica. Retomamos, assim, uma missão histórica, valendo-nos dos meios que constroem o futuro.